Ao menos 60 milhões de brasileiros têm dívidas. E isso não significa necessariamente um problema se as contas parceladas no cartão de crédito ou o financiamento do carro e casa estão dentro do que o orçamento pode suportar. De acordo com a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), 70% das famílias brasileiras têm alguma dívida. Mas, para cerca de 30 milhões, quitar os débitos já compromete mais de 30% dos ganhos.
Pagar uma prestação exige deixar de quitar a luz ou a água, atrasar a escola das crianças, optar pela parcela mínima do cartão. E está formada uma bola de neve que coloca esses consumidores na categoria de superendividados.
É pensando neles que novas regras passaram a valer neste mês. A Lei do Superendividamento facilita a negociação dos valores com credores, levando em conta que é necessário restar no orçamento o mínimo para se viver com dignidade.
Ela foi feita pensando também em proteger outros consumidores de se tornarem superendividado, proibindo práticas abusivas na hora de concessão de crédito. Entre elas, a de prometer não checar se o interessado está com o “nome sujo” ou a de pressionar idosos e pessoas menos instruídas.
O texto sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro veta trechos considerados importantes por entidades de defesa do consumidor, como proibir termos “sem juros” ou “com taxa zero” e limitar a concessão do crédito consignado. O presidente também vetou a possibilidade de desistência em até sete dias do empréstimo tomado. Mesmo com os cortes, a lei é considerada um marco importante.
“Temos um grande avanço em relação à legislação e à preocupação com os superendividados, mas de nada adiantará a lei se as pessoas não tiverem acesso ao entendimento dessas melhorias e principalmente à educação financeira, que é a real forma de combate ao superendividamento”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros, Reinaldo Domingos.
Principais pontos da Lei do Superendividamento que entrou em vigor neste mês explicados pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor)
1. Mínimo existencial
A lei garante que uma quantia mínima de sua renda não seja usada para pagar suas dívidas. Esta medida tem a intenção de impedir que você contraia novas dívidas para pagar contas básicas como água e luz
2. ‘Recuperação judicial’
Todo cidadão passa a ter direito a uma espécie de recuperação judicial para repactuar as dívidas e negociá-las com todos os credores ao mesmo tempo. A ideia é garantir acordo mais justo para os consumidores, assim como é feito quando empresas admitem falência. Consumidores deverão apresentar proposta de pagamento desses débitos no prazo de até cinco anos em que estejam “preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e formas de pagamento originalmente pactuadas”, diz a lei
3. Transparência
Bancos ficam proibidos de ocultar os riscos da contratação do crédito. Eles são obrigados a informar o custo efetivo total do crédito contratado, esclarecendo juros, tarifas, taxas e encargos sobre atraso
4. Sem pressão
Qualquer pressão dos bancos e instituições financeiras para seduzir os consumidores, envolvendo prêmio, por exemplo, é ilegal. Principalmente contra pessoas idosas, analfabetas ou vulneráveis. Se sentiu pressionado? É possível fazer denúncia de assédio à central de atendimento do próprio banco. Caso não seja resolvido, você pode falar com a ouvidoria e enviar uma reclamação para o Banco Central
5. Conciliação
A nova Lei também estipula que, antes de ir à Justiça e buscar um acordo com os credores, os consumidores terão direito a uma fase de conciliação com os órgãos de defesa do consumidor. Este tipo de atendimento é considerado facultativo pelos órgãos e, por isso, não é obrigatório. Mas o acordo também deve garantir o “mínimo existencial”
6. O que faço se a lei não for cumprida?
Se a instituição financeira se recusar a fazer a renegociação, é possível formalizar a reclamação no SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) ou ouvidoria do banco ou, de forma individual, pelo SNDC (Serviço Nacional de Defesa do Consumidor) que engloba os canais consumidor.gov, Procons e Defensorias PúblicasMETRO WORLD NEWS BRASIL12 JULHO 2021Inadimplentes devem, em média, quase R$ 4 mil cada
O Procon-SP inicia no próximo mês o atendimento via Central do Superendividamento. Ela será disponibilizada no site do órgão. O consumidor precisará se assumir superendividado – ou seja, impossibilitado de pagar as dívidas sem colocar em risco sua subsistência – em um formulário e em seguida indicar credores, o valor total da dívida e apontar sugestão para pagamento em até cinco anos.https://www.ad-sandbox.com/static/html/sandbox.html
Os credores serão convocados e será aprovado um plano de renegociação. Caso as empresas não concordem, a documentação será encaminhada para a Defensoria Pública, que poderá ingressar judicialmente pedindo a aceitação do plano de renegociação, conforme prevê a lei federal.
“Sem dúvida, essa central facilitará muito e dará acesso imediato aos superendividados para usufruir os direitos garantidos pela nova lei. O consumidor ganhará em agilidade e desburocratização e não terá necessidade de contratar um advogado para renegociar aquela dívida que já não podia pagar sem correr riscos com relação a sua própria subsistência”, afirma o diretor executivo do Procon-SP, Fernando Capez.